É possível a contratação por inexigibilidade de licitação de empresas que tenham atestado de exclusividade fornecido por órgão de registro do comércio. Mas nesse caso a administração pública deve dimensionar devidamente seus problemas e necessidades, para fixar os contornos e características das soluções disponíveis no mercado ao atendimento do interesse público.
Portanto, a contratação direta só pode ocorrer caso seja demonstrado que o produto é o único disponível no mercado a atender adequadamente a finalidade pretendida.
Não há um prazo de validade predeterminado para a aceitação do atestado de exclusividade, mas a administração tem a obrigação de certificar-se de que ele retrata uma situação atual do mercado, por meio do estabelecimento de um prazo razoável entre a sua emissão e a sua utilização como fundamento para a inexigibilidade de licitação.
O prazo de vigência do contrato pode ser superior ao prazo de validade do atestado de exclusividade, que deve ser aferida no momento da contratação. Mas se o contratado não for mais fornecedor exclusivo no momento de eventual prorrogação contratual, a administração deve certificar-se, por meio de pesquisas mercadológicas, de que as condições do ajuste original permanecem mais vantajosas em relação às existentes no mercado. Se o mercado em concorrência apresentar vantagens, deve ser realizada licitação.
Não existe prazo mínimo de vigência dos contratos, que podem ser firmados pela administração por prazo inferior a 12 meses, de acordo com o período para o suprimento de suas necessidades. O prazo máximo, em regra, não pode ultrapassar o exercício financeiro. Contudo, os serviços de execução continuada podem ser contratados por até 60 meses, desde que a administração comprove a efetiva as vantagens e a economicidade decorrentes da contratação por períodos prolongados, pois se trata de inexigibilidade de contratação em decorrência de exclusividade de fornecedor.
A prorrogação dos contratos, limitada ao período de 60 meses, pode ser realizada por prazo diferente do inicialmente ajustado; mas a administração deve adotar toda a cautela necessária para verificação das efetivas vantagens e economicidade do novo prazo a ser fixado.
Essa é a orientação do Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR), em resposta à Consulta formulada pelo prefeito do Município de Mandaguaçu, por meio da qual fez questionamentos a respeito de contratação realizada por meio de inexigibilidade de licitação
Instrução do processo
O parecer jurídico da assessoria local considerou que, por se tratar de exceção à obrigação constitucional de licitar, cabe ao ente público adotar as cautelas necessárias à instauração do respectivo processo administrativo, com a apresentação formal da justificativa para aquela contratação.
A assessoria entendeu, ainda, que a exclusividade deve ser aferida no momento da contratação; e que os prazos de contratação de serviços contínuos podem ser fixados em períodos superiores aos dos créditos orçamentários, caso haja benefícios para a administração.
A Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR lembrou que a administração deve, primeiramente, dimensionar o problema, para depois definir a sua solução e definir o objeto da licitação.
A unidade técnica destacou que o fato de uma empresa ser fornecedora exclusiva de determinado produto justificativa a inexigibilidade se existirem outros produtos semelhantes no mercado que possam atender as necessidades do ente.
A CGM ressaltou, ainda, que que não existe um prazo de validade mínimo para os atestados; mas a administração deve se certificar de que o atestado apresentado pelo fornecedor seja válido e represente uma situação de fato. Caso positivo, é possível até a vigência contratual seja superior à vigência do atestado de exclusividade, com sucessivas prorrogações, desde que comprovadas as vantagens para o ente.
O Ministério Público de Contas (MPC-PR) concordou com o posicionamento da unidade técnica.
Legislação, jurisprudência e doutrina
O inciso I do artigo 25 da Lei nº 8.666/93 prevê que é inexigível a licitação quando for inviável a competição, em especial “para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes”.
O inciso III do parágrafo único do artigo 26 da Lei de Licitações e Contratos dispõe que o processo de inexigibilidade de licitação será instruído com a justificativa do preço.
O artigo 57 da Lei nº 8.666/93 fixa que a duração dos contratos administrativos ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários. O inciso II desse artigo prevê como exceção os contratos relativos à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a 60 meses.
A Súmula 255 do Tribunal de Contas da União (TCU) possui o entendimento de que nas contratações em que o objeto só possa ser fornecido por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, é dever do agente público responsável pela contratação a adoção das providências necessárias para confirmar a veracidade da documentação comprobatória da condição de exclusividade.
O Acórdão nº 1214/2013 – Plenário do TCU expressa que, como regra, a fixação do prazo de vigência dos contratos para a prestação de serviços de natureza contínua deve levar em consideração a obtenção de melhor preço e de condições mais vantajosas para a administração e não a vigência dos respectivos créditos orçamentários. O documento fixa também que quanto maior o prazo de vigência desses contratos, maior é a segurança das empresas para ofertar seus preços, tendo em vista a estabilidade que lhes é oferecida no negócio. Com isso, é esperado um aumento da concorrência, com a expectativa de melhores preços e a participação de empresas mais qualificadas para prestar os serviços. Além disso, dispõe que o prazo de vigência de 60 meses só traz benefícios à administração, pois os procedimentos atualmente adotados para a prorrogação serão significativamente reduzidos.
O Acórdão 551/02 – Segunda Câmara do TCU estabelece que “não fica a entidade obrigada a respeitar o mesmo prazo da contratação original. Pois, mesmo que o texto da norma aluda a “iguais períodos” a leitura muito restrita da norma traria um engessamento para o administrador, o que não era o objetivo do legislador. Se é possível prorrogar por 60 meses, não seria razoável subordinar a administração ao dever de estabelecer períodos idênticos para vigência, seguindo o prazo inicialmente avençado no contrato. Então, nesse aspecto, não haveria qualquer irregularidade na prorrogação por mais 24 meses do contrato inicialmente avençado, com prazo de 36 meses”.
A Orientação Normativa nº 38 da Advocacia Geral da União (AGU) expressa que “nos contratos de prestação de serviços de natureza continuada deve-se observar que: a) o prazo de vigência originário, de regra, é de até 12 meses; b) excepcionalmente, este prazo poderá ser fixado por período superior a 12 meses nos casos em que, diante da peculiaridade e/ou complexidade do objeto, fique tecnicamente demonstrado o benefício advindo para a Administração; e c) é juridicamente possível a prorrogação do contrato por prazo diverso do contratado originariamente.”
O Acórdão nº 792/09 – Tribunal Pleno (Consulta nº 792/09) do TCE-PR dispõe que não existe razão plausível de ordem lógica ou jurídica para se impedir a prorrogação contratual por período diferente daquele originariamente ajustado, se for mais vantajoso para a administração.
Renato Geraldo Mendes e Egon Bockmann Moreira entendem que a exclusividade do fornecedor é a consequência lógica da relação entre a necessidade que se pretende satisfazer e a solução capaz de viabilizar a desejada satisfação; e que é preciso que se demonstre a adequação entre a necessidade e a solução.
Marçal Justen Filho tem o entendimento de que é possível a realização de contratos com prazo de vigência de até 60 meses, reduzindo-se custos unitários e gerenciais do contratado, obtendo a administração preços mais vantajosos.
Decisão
O relator do processo, conselheiro Fernando Guimarães, lembrou que a legislação permite, como fundamento para a inexigibilidade, a apresentação de atestados de exclusividade fornecidos por órgãos de registro de comércio da localidade da licitação ou da obra ou serviço. No entanto, ele enfatizou que não basta a apresentação do atestado para que a licitação seja inexigível, pois é necessário comprovar a adequação entre a necessidade da administração pública e a solução do objeto fornecido por fornecedor exclusivo.
Guimarães ressaltou que a administração deve se certificar de que o atestado apresentado pelo fornecedor seja válido, pois a exclusividade do fornecimento deve ser contemporânea à contratação; e que não existe um prazo de validade mínimo para o atestado, que deve representar uma situação de fato.
Além disso, o conselheiro afirmou que quanto mais recente for a emissão do atestado de exclusividade maior a chance de exprimir uma situação de fato verdadeira; e que não há qualquer impeditivo legal para que o prazo de vigência do contrato seja superior ao prazo de vigência do atestado.
O relator destacou, também, que a administração deve verificar no decorrer da execução contratual se a situação de exclusividade do fornecimento do objeto ainda persiste. Isso porque, no caso da cessação da exclusividade, o contratado pode ficar impossibilitado de dar continuidade à prestação o objeto, caso não seja mais seu fornecedor.
Finalmente, Guimarães frisou que os prazos de vigência dos contratos decorrentes de licitações devem guardar relação com os respectivos créditos orçamentários, conforme prevê o artigo 57 da Lei nº 8.666/93; mas a fixação desse prazo deve considerar, também, as melhores condições para a administração, tendo em vista o princípio da efetividade e da economicidade.
Os conselheiros aprovaram o voto do relator, por unanimidade, por meio da Sessão nº 19 do Plenário Virtual do Tribunal Pleno do TCE-Pr, concluída em 25 de novembro de 2020. O Acórdão nº 3249/21 foi disponibilizado em 3 de dezembro, na edição nº 2.674 do Diário Eletrônico do TCE-PR, veiculado no portal www.tce.pr.gov.br.
Fonte: TCE/PR