Inicialmente, é preciso esclarecer e destacar que o uso de robôs em certames licitatórios não é indevido, tampouco ilegal. O que é conhecido popularmente por “robô de lances” nada mais é do que um programa ou uma ferramenta de envio automático de lances, auxiliando no envio de lances no pregão eletrônico. Não há o que se falar em ser indevido ou ilegal o seu uso, isto porque, a Instrução Normativa número 671 instituiu o Sistema de Dispensa Eletrônica, ou seja, uma tecnologia usada para a parametrização de lances, o que significa que a própria Administração Pública começou a incorporar a tecnologia em seu favor durante certames licitatórios, modernizando-os.
Assim, o uso da tecnologia a favor dos licitantes e da própria Administração Pública não fere os princípios da isonomia e da igualdade, sobretudo porque a própria Instrução Normativa enfatiza os parâmetros para este uso. O “robô” de lances apenas simplifica o procedimento de lances e diminui o trabalho humano envolvido no certame, facilitando que a licitante não perca a oportunidade de enviar o seu lance no momento correto, fazendo isso de forma mais ágil e eficiente.
Não se trata de vantagem ou procedimento anti-isonômico, pois se trata apenas de simplificação do trabalho da licitante durante o processo licitatório. Neste sentido, importante destacar que durante uma solicitação realizada pela CGU (Controladoria Geral da União) a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI) do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão encaminhou o Ofício nº 1531/DLSG-MP, de 09 de junho de 2011, onde consideram que tal uso não é ilegal: “2. Esclarecemos que desde 2004 que o Ministério do Planejamento e o SERPRO identificaram no Sistema de Pregão Eletrônico o uso de programa (Robô) encaminhando lances, de forma extremamente rápida. Procedimento este que não foi considerado ilegal pelo jurídico.”
Além disso, há conhecida fala do Ministro do Tribunal de Contas, Benjamin Zymler, a respeito do assunto, quando menciona que: “A utilização de ferramentas de informática, em especial dos robôs, representa um ganho evidente de produtividade, pois permite que até mesmo auditores não familiarizados com técnicas ou ferramentas de TI tenham acesso a informações e análises automáticas.”
Além disso, no ano de 2019, o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais divulgou, após o julgamento da Denúncia número 1.066.880, que a utilização de robôs em licitações não traz nenhum prejuízo para a Administração, afirmando justamente ao contrário: que traz benefícios para que seja ofertado o menor preço possível 2 : “Chegamos à conclusão de que a participação do robô não traz prejuízo para a licitação. E, para a administração pública, é bom que o produto seja ofertado pelo menor preço possível.”
No mesmo caso supracitado, a posição do Tribunal de Contas de Minas Gerais é completamente favorável ao uso de robôs em licitações, confirmando o entendimento anteriormente mencionado, qual seja, o de que este mecanismo serve para otimizar os procedimentos na licitação, utilizando a tecnologia em favor do bem comum: “A utilização de software nada mais é do que mecanismo de eficiência para baixar os lances rapidamente. Penso que, cada vez mais, é necessário não temer a inovação no serviço público, utilizando-se a tecnologia em benefício da sociedade. Tratando a questão de processos licitatórios, a otimização trazida pelo uso da robótica favorece a celeridade e eficiência, princípios caros à Administração Pública”.
Fulminando a pretensão do recorrente, o Tribunal de Contas da União, em decisões mais recentes, depois de regulamentada a matéria no âmbito federal, frize-se, que não proibiu a utilização de robôs, entendeu que o respeito ao regramento federal, independentemente da utilização ou não de softwares, já seria suficiente para afastar o risco da quebra da isonomia:
Quanto aos demais itens apontados, as informações prestadas pelo SesiSP também demonstraram sua improcedência. Assim, em relação à questão atinente ao item “c”, foi esclarecido que o Sesi-SP utiliza a plataforma Licitações-e do Banco do Brasil, que já dispõe de mecanismos inibidores da utilização de “robôs” nos certames.
Por fim, em relação à alegada falta de clareza do objeto, em razão de suposta falta de definição do que será considerado como pernoite para efeitos de remuneração, as situações de pernoite estão detalhadas no item 4.5 do Memorial Descritivo (anexo B) do Edital. (TCU – RP: 02244420190, Relator: AUGUSTO SHERMAN, Data de Julgamento: 03/09/2019, Primeira Câmara). Em acórdão de novembro de 2020, o TCU, de forma mais explícita, demonstrou que a tendência é a flexibilização do assunto, entendendo que a utilização de robôs é um fenômeno praticamente inevitável: 4 […] 18. A duas, porque é preciso reconhecer que na atual era digital, com uma infinidade de ferramentas tecnológicas à disposição, tentar proibir ou limitar o uso de programas que automatizem qualquer aspecto da vida parece um retrocesso.
A utilização desses softwares pelos licitantes acaba por ser inevitável, sendo, inclusive, já amplamente utilizado. Ora, se até o poder público (como o próprio TCU), com todo o balizamento normativo que o cerca, procura se valer de vários “robôs” para maximizar a eficiência de sua atuação, é natural que as empresas também adotem, até com mais avidez, ferramentas tecnológicas que lhes confiram melhores atuações mercadológicas.
Portanto, nesse momento em que a discutida possibilidade do uso de robôs em pregões eletrônicos não se descortina com clareza cristalina, resta concluir pela ausência da plausibilidade jurídica dessa alegação. Vale lembrar que, confirmando a divergência dessa matéria, esta Corte de Contas poderá provocar o chamado Incidente de Uniformização de Jurisprudência, prevista nos artigos 15 e 91 do seu Regimento Interno, apreciando preliminarmente a controvérsia e, ao final, formatar um entendimento paradigmático. (ACÓRDÃO 2959/2020 – PLENÁRIO – Relator: RAIMUNDO CARREIRO – Processo: 040.406/2019-9 – Tipo de Processo: REPRESENTAÇÃO (REPR) – Data da Sessão: 04/11/2020).
Dentro deste contexto, portanto, é importante mencionar que não existe nenhuma lei proibindo a utilização de robô de lances. Portanto, não resta dúvida acerca da legalidade da utilização de programa ou uma ferramenta de envio automático de lances, auxiliando no envio de lances em pregões eletrônicos, desde que o programa/ferramenta a ser utilizado tenha como objetivo melhorar a performance do licitante na fase de lances e não burlar o sistema.