Dia 23 de setembro de 2019, foi publicado o Decreto Federal nº 10.024/2019, que regulamenta o pregão eletrônico para a aquisição de bens e a contratação de serviços comuns, incluídos os de engenharia, além de dispor sobre o uso da dispensa eletrônica no âmbito da Administração Pública Federal.
O novo decreto entra em vigor no próximo dia 28 de outubro de 2019, revogando, a partir de então, as disposições do decreto 5.450, de 31 de dezembro de maio de 2005 e do decreto 5.504, de 5 de agosto de 2005.
Importante referir que o mesmo aplica-se à administração pública federal direta, às autarquias, às fundações e aos fundos especiais. Também será obrigatório para os entes federativos que utilizem recursos da União decorrentes de transferências voluntárias, tais como convênios e contratos de repasse.
Em linhas gerais, o Decreto Federal nº 10.024/2019 apresenta novos contornos aos procedimentos operacionais do pregão eletrônico, sedimentando entendimentos consagrados na doutrina e na jurisprudência do Tribunal de Contas da União e corrigindo distorções atreladas à forma de programação eletrônica das plataformas tecnológicas, tais como o uso de robôs, insuficiência do “tempo aleatório” para obtenção das melhores propostas e a atuação do licitante “coelho”.
Assim, vejamos as principais novidades trazidas pelo novo decreto que altera as regras do Pregão em sua forma eletrônica.
1. USO DO PREGÃO PARA SERVIÇOS COMUNS DE ENGENHARIA (art. 1º).
A grande novidade do decreto acerca desse tema foi a previsão em nível de regulamento da possibilidade do uso dessa modalidade para contratação de serviços de engenharia considerados comuns.
Cumpre ressaltar que a admissibilidade do pregão para serviços de engenharia já era sedimentada na prática da Administração Federal e na jurisprudência do TCU. A Corte Federal de contas chegou a editar em 2010 a Súmula nº 257 com o seguinte texto: “O uso do pregão nas contratações de serviços comuns de engenharia encontra amparo na Lei nº 10.520/2002.”
2. OBRIGATORIEDADE DO USO DO PREGÃO ELETRÔNICO (art. 1º).
Diferentemente do estabelecido no art. 4º do Decreto nº 5.450/05 que indica a utilização preferencial da forma eletrônica do pregão para a aquisição de bens e serviços comuns, o art. 1º, §1º, da redação do novo decreto, torna obrigatório o uso do pregão eletrônico pelos órgãos da administração pública federal direta, autárquica, fundacional e os fundos especiais.
Ademais, os estados, Distrito Federal e municípios também serão afetados nos processos de contratações que envolverem transferências de recursos da União.
3. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO PRINCÍPIO NORTEADOR (art. 2º).
É consabido que a licitação possui três objetivos definidos no art. 3º da Lei nº 8.666/93: a garantia da observância do princípio constitucional da isonomia; a seleção da proposta mais vantajosa para a administração; e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável.
Esse último foi acrescentado no Estatuto das Licitações pela Lei nº 12.349/2010 e, agora, expressamente previsto como princípio.
4. UTILIZAÇÃO DO COMPRASNET (art. 5º).
O decreto dispõe acerca da utilização obrigatória do Sistema de Compras do Governo Federal – Comprasnet para a realização das licitações na modalidade pregão, em especial para os órgãos e unidades da Administração Federal direta, autárquica e fundacional.
5. ESTUDO TÉCNICO PRELIMINAR (art. 8º).
A norma prevê o estudo técnico preliminar como uma das peças que devem compor a instrução dos processos de contratação na modalidade pregão.
Tal estudo representa a primeira etapa do planejamento de uma contratação e que dá base ao termo de referência, que somente é elaborado se a contratação for considerada viável.
6. ORÇAMENTO SIGILOSO (art. 15).
Atualmente o orçamento sigiloso tem previsão legal expressa no Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC e na Lei das Estatais. Por outro lado, o orçamento sigiloso não é admitido nas modalidades da Lei nº 8.666/1993, pois este diploma expressamente exige que o orçamento estimado conste como um dos anexos do edital do certame (art. 40, § 2º, II, da Lei nº 8.666/1993).
A nova regulamentação do pregão eletrônico segue a tendência das mais recentes legislações sobre contratação pública, para prever a possibilidade de o valor estimado ou valor máximo aceitável para a contratação seja considerado sigiloso.
7. CAPACITAÇÃO DOS AGENTES ENVOLVIDOS (art. 16).
O novo decreto aduz acerca da obrigatoriedade de os órgãos e entidades da Administração prevejam esforços de treinamento para a formação e a atualização técnica de pregoeiros, membros da equipe de apoio e demais agentes encarregados da instrução do processo licitatório.
8. MEIOS DE PUBLICAÇÃO (art. 20).
O novo decreto retirou a exigência de que a convocação de interessados (aviso do edital), tenha de ser realizada através de divulgação em jornal de grande circulação local, regional ou nacional, a depender dos valores estimados à contratação.
Nesse sentido, a convocação dos interessados será procedida por meio de publicação de aviso de edital, no Diário Oficial da União e no sítio oficial do órgão ou entidade promotora da licitação, na internet.
Ainda, cumpre referir que tal novidade foi trazida recentemente pela Medida Provisória nº 896, de 9 de setembro de 2019.
9. PRAZO PARA REALIZAÇÃO DE PEDIDO DE ESCLARECIMENTO E IMPUGNAÇÃO (art. 23 e 24).
Os pedidos de esclarecimentos serão enviados ao
pregoeiro, até três dias úteis anteriores à data fixada para abertura da sessão
pública, por meio eletrônico, na forma do edital.
O pregoeiro terá o prazo de dois dias úteis,
contado da data de recebimento do pedido, e poderá requisitar subsídios aos
responsáveis pela elaboração do edital e dos anexos.
Importante esclarecer que as respostas aos
pedidos de esclarecimentos serão divulgadas pelo sistema e vincularão os
participantes e a administração.
Até três dias úteis anteriores à data fixada para abertura da sessão pública, qualquer pessoa poderá impugnar os termos do edital do pregão, por meio eletrônico, na forma prevista no edital.
Caberá ao pregoeiro, auxiliado pelos responsáveis pela elaboração do edital e dos anexos, decidir sobre a impugnação no prazo de dois dias úteis, contado da data de recebimento da impugnação.
10. ENVIO DOS DOCUMENTOS DE HABILITAÇÃO (art. 25).
Após a divulgação do edital no sítio eletrônico, todos licitantes terão a obrigatoriedade de encaminhar, concomitantemente com a proposta de preço, os documentos de habilitação exigidos no edital, exclusivamente por meio do sistema.
Note-se que essa regra é uma das inovações importantes que o Decreto implementa: o cadastramento das propostas e dos documentos de habilitação no mesmo momento.
11. DIFERENTES MODOS DE DISPUTA E ENVIO DE LANCES (art. 31).
Serão adotados para o envio de lances os modos de disputa aberto e fechado. Vejamos o que prevê o portal de compras governamentais acerca do tema.
(i) Modo de disputa aberto: os licitantes apresentarão lances públicos e sucessivos, com prorrogações, conforme o critério de julgamento adotado no edital.
Nesse caso, o edital deve prever intervalo mínimo de diferença de valores ou de percentuais entre os lances, que incidirá tanto em relação aos lances intermediários quanto em relação ao lance que cobrir a melhor oferta.
(ii) Modo de disputa aberto e fechado: os licitantes apresentarão lances públicos e sucessivos, com lance final e fechado, conforme o critério de julgamento adotado no edital.
Aqui, a regra do intervalo mínimo de diferença de valores ou de percentuais entre os lances será facultativa.
No modo de disputa aberto a etapa de envio de lances na
sessão pública durará dez minutos e, após isso, será prorrogada
automaticamente pelo sistema quando houver lance
ofertado nos
últimos dois minutos do período de duração da sessão pública.
A prorrogação automática da etapa de envio de
lances será
de dois minutos e ocorrerá sucessivamente sempre que
houver lances enviados nesse período de prorrogação, inclusive quando
se tratar de lances intermediários.
Caso não haja novos lances, a sessão pública será encerrada
automaticamente.
Poderá haver reinício da etapa de
envio de lances, mediante justificativa, quando a sessão
pública foi encerrada sem as prorrogações automáticas pelo sistema, em
prol da consecução do melhor preço.
No modo de disputa aberto e fechado a etapa de envio de lances da sessão pública terá duração de quinze minutos.
Encerrado o prazo de 15 minutos, o sistema encaminhará o aviso de fechamento iminente dos lances e, transcorrido o período de até dez minutos, aleatoriamente determinado, a recepção de lances será automaticamente encerrada.
Após o prazo de 10 minutos, o sistema abrirá a oportunidade para que o autor da oferta de valor mais baixo e os autores das ofertas com valores até dez por cento superiores àquela possam ofertar um lance final e fechado em até cinco minutos, que será sigiloso até o encerramento deste prazo.
Não havendo, no mínimo, três ofertas nas condições acima, os autores dos melhores lances subsequentes, na ordem de classificação, até o máximo de três, poderão oferecer um lance final e fechado em até cinco minutos, que será sigiloso até o encerramento do prazo.
Esgotados esses prazos, o sistema ordenará os lances em ordem crescente de vantajosidade.
Haverá, ainda, oportunidade de reinício da etapa fechada para que os demais licitantes, até o máximo de três, na ordem de classificação, possam ofertar um lance final e fechado em até cinco minutos. Isso, quando não houver nenhum lance final e fechado enquadrado nas oportunidades acima.
Em caso de inabilitação do licitante classificado na etapa de lance fechado, o pregoeiro poderá, auxiliado pela equipe de apoio, mediante justificativa, admitir o reinício da etapa fechada.
12. CRITÉRIOS DE DESEMPATE (art.37)
Após a etapa de envio de lances haverá a aplicação dos critérios de desempate previstos nos art. 44 e art. 45 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, seguido da aplicação do critério estabelecido no § 2º do art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993, se não houver licitante que atenda à primeira hipótese.
Não havendo envio de lances após o início da fase competitiva, remanescendo somente as propostas iniciais, os critérios de desempate serão aplicados da seguinte forma: (i) observância dos critérios de desempate previstos nos art. 44 e art. 45 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, seguido da aplicação do critério estabelecido no § 2º do art. 3º da Lei nº 8.666, de 1993, se não houver licitante que atenda à primeira hipótese; e
(ii) persistindo o empate, haverá sorteio pelo sistema eletrônico dentre as propostas empatadas.
Por fim, cumpre referir que Decreto Federal n. 10.024/2019 inaugura um modelo de pregão eletrônico mais arrazoado, o qual irá melhorar a percepção do mercado sobre a seriedade da disputa, o que deve atrair licitantes mais qualificados, que apresentam propostas verdadeiramente vantajosas.
Desse modo, os pregões cujo instrumento convocatório for publicado antes de 28 de outubro de 2019 deverão ser processados com observâncias às normas previstas no Decreto nº 5.450/2005. Já os certames cujo edital venha a ser publicado após a entrada em vigor do novo regulamento, deverão estar adaptados aos mandamentos do Decreto nº 10.024/2019.
MAURICIO GAZEN
OAB/RS 71.456